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Música

Música para multidões
Isabel Bonorino

O ano terminou e, junto com ele, o fim da maratona de concertos e recitais natalinos em várias cidades gaúchas. Alguns projetos já têm uma longa estrada, outros são novos, mas em comum o mesmo resultado: centenas de pessoas lotam praças, parques, igrejas buscando um espaço para assistir nossas orquestras, solistas e corais. Em Porto Alegre, duas grandes orquestras movimentaram centenas de profissionais para seus últimos compromissos do ano.

Um dos locais já tradicionais para concertos ao ar livre é o parque Moinhos de Vento, o Parcão, como é conhecido pelos porto-alegrenses. Diariamente o local é ocupado por quem quer fazer caminhadas, corridas, passeios ou simplesmente para tomar um bom chimarrão com os amigos.

O concerto do dia 14 de dezembro, inicia às 20 horas, mas o público começa a chegar no início da tarde, curioso para ver o que está acontecendo. A movimentação do pessoal que faz a passagem de som anima quem resolveu dar uma conferida e já curtir um pouquinho do show que está por vir. Quem mora perto, dá uma passada e volta mais tarde ou assiste da janela ou da sacada do seu apartamento.

Entra em cena o projeto Concertos Comunitários Zaffari, com Coral e Orquestra Filarmônica da Puc, que completou, em 2008, 21 anos de apresentações por todo o Estado.

O dia nublado de verão, mas com temperatura amena, previa que a chuva não estaria presente no evento, garantindo mais uma vez o sucesso da produção que contou com dezenas de profissionais e milhares de expectadores.


Aquecendo corpo e alma

Pouco antes do início do concerto, o clima é de concentração nos camarins e nas adjacências onde o grupo se reúne. São solistas, músicos, coralistas, além de bailarinos e da produção do evento.

O baixo Pedro Spohr, professor de técnica vocal, começa uma sessão de aquecimento com o coro. O chamado `vocalize` é responsável por aquecer as cordas vocais dos cantores, que trabalhadas da forma correta possibilitam maior e melhor alcance de agudos e graves de todos os naipes. Vestidos com longas batas vermelhas, sopranos, contraltos, tenores e baixos se preparam para o último concerto do ano. Feito o aquecimento vocal, é hora de aquecer o coração e a alma. O maestro Frederico Gerling Júnior, do alto dos seus 83 anos, se aproxima do grupo e todos de mãos dadas oram agradecendo o bom ano que passou e desejando um concerto maravilhoso para todos. Esse ritual é normal e conhecido pelos que acompanham Gerling Jr. O vigor e a alegria do velho maestro são exemplo para vida de qualquer jovem de menos de 80 anos que o veja em ação.

Os solistas, em seus camarins, também fazem seu aquecimento. A soprano Adriana de Almeida, diretora do Instituto de Cultura Musical da PUC/RS, responsável pelo evento em conjunto com a Opus, tem trabalho em dobro. Além de se preocupar com sua própria preparação para o espetáculo, fica atenta à produção do evento.


Emoção e beleza em canto

Na hora marcada para começar o concerto, o maestro lentamente sobe ao palco para receber os primeiros de tantos aplausos que receberá na noite agradável de dezembro. O carisma de Gerling Jr. é evidente não só pelo olhar carinhoso do coral, mas com o do público que lota a quadra de esportes do Parcão e acompanha atento o espetáculo e a fala do regente. Depois de vinte e um anos de concertos, realmente seria improvável não ser assim.

A apresentação teve presença dos solistas Adriana de Almeida, Marcello Vannucci, Panta, Flávio Leite e Pedro Spohr, que deu um show à parte fazendo o público dançar com o clássico gospel “Oh, happy day”. O repertório também contou com obras de Rossini e Mendelssohn, além das tradicionais músicas de Natal.

Neste ano, o evento conhecido por trazer atrações nacionais, teve presença do cantor Guilherme Arantes, que encantou a platéia com sucessos como Coisas do Brasil e Planeta Água. Também o Ballet Concerto, de Victória Milanez, fez uma bela apresentação utilizando mais de 400 peças de figurino trazendo a magia do Natal com anjos e até uma Virgem Maria. Entre músicos, coral, bailarinos e produção, uma equipe de cerca de 300 pessoas foi mobilizada para o evento que encerrou com a tradicional queima de fogos.


Então, é Natal?

Na Praça da Matriz, na noite de 18 de dezembro, centenas de porto-alegrenses foram conferir a sexta edição do Natal na Praça. Dessa vez, entram em cena a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e seu coral com o concerto “Uma Noite em Viena”. Apesar de o nome remeter às famosas valsas vienenses, logo no começo, uma surpresa: um terno de reis anunciava a chegada do menino Jesus. A tradição portuguesa teve um sotaque que mais lembrava o folclore nordestino e admirou o público que não tinha acesso às cadeiras colocadas apenas para convidados (em grande parte, familiares de músicos e coralistas, além de políticos e assessores). A professora Zenaide Machado achou a mistura meio esquisita, comentando que já que queriam inovar, seria mais interessante um terno de reis mais gaúcho.


Até o coral parou para assistir ao concerto
(foto Itamar Aguiar – Palácio Piratini)


Santinhos fora de época

O maestro Isaac Karabtchevsky iniciou o concerto e logo chamou a governadora Yeda Crusius, que prestigiava o evento para receber do presidente da Ospa, Ivo Nesralla, um quadro onde foi fotografada junto à orquestra pelo artista Leonid Streliaev. O regalo foi uma retribuição à governadora pela acolhida à orquestra, que está ensaiando no Palácio Piratini enquanto o novo teatro não é construído. “Temos o orgulho de ver que o Estado tem uma orquestra maravilhosa como essa", afirmou Yeda.

Na seqüência do concerto, ao executar a valsa Contos dos Bosques de Viena, de Strauss, Karabtchevsky convidou quatro casais para acompanhar a música dançando. Novamente a Governadora, juntamente com seu marido, Carlos Crusius, rouba a cena do evento, e atende o maestro, seguida por outros casais. Os aplausos à Yeda revelam que sua estratégia de marketing está dando certo. “Tá certa, política se faz o ano inteiro; só falta ela trazer os santinhos”, comenta o advogado José Goulart ao ver a cena.


Concerto para a juventude reclamar

As valsas foram intercaladas com as tradicionais canções natalinas cantadas pelo coral, tirando um pouco da graça das mesmas, costumeiramente feitas em bloco. A vendedora Valquíria Mércio, de Canoas, que o diga. Resolveu trazer os sobrinhos Ademar, Thiago e Rafael ao concerto para apresentar aos meninos de 10, 9 e 8 anos, respectivamente, músicas diferentes das conhecidas por eles. Porém, a tentativa não teve muito sucesso: a gurizada achou o concerto meio chato e sem graça. Na tentativa de uma nova avaliação, perguntei se realmente não gostaram de nada mesmo e surgiram novas respostas. Instrumentos como flauta e o violino e também o canto coral chamaram a atenção dos meninos, para alívio da tia que já se envergonhava da sinceridade das crianças.


Valquíria e os sobrinhos: empolgação mesmo só para tirar a foto
(foto: Isabel Bonorino - AG)


Fogos salvadores

A comemoração também contou com fogos de artifício e toques dos sinos da Catedral Metropolitana, além da chegada do Papai Noel e a benção do arcebispo de Porto Alegre, dom Dadeus Grings. Quem acompanha os concertos na Praça da Matriz há mais tempo afirma que ao contrário do que se esperava o evento não tem evoluído. “Ano passado já cancelaram por causa da chuva. Este ano, a praça está bonita, mas o concerto não teve nada demais”, lamenta a aposentada Maria de Fátima Nascimento.

No mesmo dia e quase no mesmo horário, no teatro São Pedro, a Orquestra Sinfônica de Santa Maria realizava concerto com os solistas Rami Ritter e Leniza Mena Barreto. Cerca de vinte concertos foram realizados na região metropolitana e nas principais cidades do Estado, somente no mês de dezembro. Os números mostram que cada vez mais a música lírica ganha espaço no Rio Grande do Sul. E que venha 2009!


Os tradicionais fogos de artifício encerram o Natal na Praça 2008
(foto Itamar Aguiar – Palácio Piratini)


02/01/2009

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  Isabel Bonorino

Isabel Bonorino é jornalista, radialista e relações públicas. Musicista, dedicou-se ao canto lírico de 1995 a 2005, atuando como soprano nos corais da Ospa e PUC. Foi colaboradora da Revista Literária Blau e produtora/apresentadora na Rádio da Universidade, onde criou o programa "UFRGS em Canto". Atualmente é produtora e repórter da TV Assembléia.

isabel@artistasgauchos.com.br
twitter.com/ISAbonorino


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