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Resenha

Vocação, resistência e trabalho em Steven Pressfield
Marta Leiria

Ainda que eu tenha preferência pela leitura de prosa ficcional, para escrever minha alma evoca a crônica e sua curta variante, a minicrônica. Só que nem tudo pode ser dito nesse gênero literário, a não ser, é claro, que o escritor esteja disposto a ser cancelado ad nutum, da mesma forma como são demitidos os detentores de cargos em comissão. Por essas e outras, escolho bem minhas pautas e às vezes recorro à escrita ficcional: quem tem fome de confessar “verdades” sabe muito bem que algumas só podem ser externadas pela boca das personagens. Outras, só com o uso de pseudônimo — que o digam Clarice Lispector e Elena Ferrante. De qualquer sorte, o mais difícil não é escrever, mas sentar para escrever. O que nos impede de sentar para escrever é a resistência. E isso vale para todos que têm a ânsia de se dedicar a uma vocação, projeto, empreendimento. Em A guerra da Arte, Steven Pressfield revela providenciais segredos. Conta que quase foi vencido pela implacável resistência ao começar a escrever esse livro. Ele é escritor de ficção e a voz em sua cabeça tentava convencê-lo de que não deveria expor conceitos diretos sobre resistência de maneira literal; em vez disso, deveria incorporá-los metaforicamente a um romance. Confessa: “O que finalmente me convenceu a seguir em frente foi simplesmente o fato de que me senti muito infeliz ao desistir do projeto. Comecei a desenvolver sintomas. Tão logo me sentei e comecei a trabalhar, senti-me bem outra vez”. E o que dizer da procrastinação? Eis a manifestação mais comum de resistência, porque é a mais fácil de racionalizar. O escritor diletante não diz a si mesmo que nunca escreverá o sonhado livro solo, mas com incrível facilidade jura que começará a escrevê-lo amanhã. Pressfiel adverte que a resistência é diretamente proporcional ao amor. Se não amássemos o projeto, não sentiríamos nada. O contrário de amor não é ódio, mas indiferença. Quanto mais resistência sentimos, mais importante para nós mesmos a vocação ou ação. Isso vale para tudo, inclusive para aquele projeto pessoal de mandar embora os quilos extras que tanto nos incomodam e que teimam em retornar — a clássica racionalização de que na segunda-feira eu começo. Se a resistência é implacável, há uma forma de vencê-la. Estudar e dominar a técnica daquilo que queremos empreender vale como pré-requisito. Só que algum talento e técnica não bastam. Trabalhar com afinco é preciso. O escritor dá a pista: “O profissional sabe que a resistência é como um operador de telemarketing, se você disser não mais que um alô, está perdido. O profissional nem atende ao telefone. Ele continua trabalhando.” Eu sei, parece de outro mundo, mas é a pura verdade: não raro, antes de me sentar para trabalhar, não tenho a menor ideia do que surgirá na tela em branco. Mas ao limpar e organizar meu gabinete, e me sentar com a cuia de chimarrão em punho, rodeada por minhas joias literárias e fotografias das pessoas que mais amo, a musa, ou a inspiração, como queiram, entra pela porta, pousa no meu ombro e, enquanto estou ali sentada, sussurra frases, lembranças adormecidas. Até mesmo conclusões nunca antes cogitadas. Sugere que eu abra aquele livro da estante contendo frases sublinhadas há muitos anos. E as letras e palavras começam, surpreendentemente, a se atrair umas às outras. A pergunta a ser feita e respondida por mim mesma é: — Isso que tanto quero fazer, essa sede de escrever, vai salvar o mundo? Claro que não, mas pode salvar a mim mesma! A melhor frase de Pressfield, para não esquecer?: “Quanto mais importante uma vocação ou ação for para a evolução de nossa alma, mais resistência sentiremos em persegui-la.” E então, caro leitor, que tal responder a estas perguntinhas? Desistir daquele projeto pessoal tão desejado, por acomodação, preguiça ou medo, ainda é uma opção? Quer salvar a própria alma ainda nesta vida terrena, ou vai deixar para o mundo que talvez venha depois? Está começando a apresentar sintomas físicos ou mentais por desistir daquele projeto? Se você respondeu com verdade ao que perguntei, e quer dar um sentido maior à própria vida, então ler Steven Pressfield será uma excelente opção para vencer de vez a desgraçada resistência.


08/05/2023

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  Marta Leiria

Marta Leiria é escritora e Procuradora de Justiça aposentada. Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS (1985). Ingressou na carreira do Ministério Público do RS no ano de 1988, aposentando-se em março 2019. Iniciou-se em 2012 na arte da crônica e do conto, participando de oficinas de escrita criativa e publicando artigos em Zero Hora e outros jornais. Lançou seu primeiro livro individual de crônicas e contos na 65ª Feira do Livro de Porto Alegre: A inveja nossa de cada dia e outras reflexões crônicas, Ed. Metamorfose, 2019. A obra foi finalista do Prêmio Minuano de Literatura 2020 na categoria Crônica e do Prêmio Apolinário Porto Alegre 2020, da Academia Rio-Grandense de Letras.

martalealpach@gmail.com


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