Todos que escrevem literatura já pensaram em desistir. Pela falta quase total de apoio da mídia, pela avalanche de blockbusters norte-americanos que invadem livrarias e até escolas, contando as mesmas histórias e com os mesmos valores dos filmes e dos desenhos que todo dia inundam a televisão. Mas não desistimos. Há algo que nos leva adiante, nos renova, cada encontro com alunos, professores, leitores nos relembra do motivo de termos escolhido este caminho.
Eu por duas vezes já pensei seriamente em desistir da carreira literária e me dedicar à profissional, que tem se desenvolvido muito bem. Dessa última vez, com o fim do contrato com a Editora e o nascimento do meu segundo filho, a tentação de largar tudo foi grande. Mas eu não podia, aos 16 anos publiquei meu primeiro livro, desde então dou palestras sobre ele em escolas, isso é mais da metade da minha vida. Escrever está no meu DNA: eu até poderia ter sucesso financeiro sem escrever, mas não me sentiria completo.
Então resolvi, agora, apostar todas as fichas. Criei minha própria editora para ter mais liberdade de distribuir meus livros da forma que achar mais conveniente, divulgar melhor o trabalho e gerenciar melhor minha carreira. Já perdi a ilusão de que alguma grande editora vá me "descobrir", estou mais maduro e bastante consciente do funcionamento do mercado editorial, da mídia, ainda mais em tempos de globalização e digitalização.
Por isso, quando chegou a hora de fazer reimpressão de um dos meus livros esgotados, com nova ilustração, parei e pensei: não, dessa vez não quero simplesmente publicar mais um livro. Quero algo ousado, diferente, inovador. As pessoas podem achar uma porcaria, odiarem, mas quero que este livro seja único. Que minha carreira seja única.
Assim surgiram, quase ao mesmo tempo, três ideias para o Vencer por linhas tortas, todas elas com origem no meu estudo sobre literatura digital, que levei do doutorado para a web através do portal LiteraturaDigital.com.br.
Em primeiro lugar, a possibilidade de interação com o leitor. Sei que há livros em que o leitor vai pulando páginas para avançar na história, o chamado livro-jogo. Mas não é o caso, aqui simplesmente o leitor escolhe que atitude tomaria diante do dilema ético proposto no livro e, a partir daí, terá um final de acordo com suas escolhas. Como havia muitas reclamações sobre o final da história original, que provocava a reflexão, não a satisfação alienante dos blockbusters, a possibilidade de o leitor escolher seus caminhos fará com que ele se sinta responsável pelo final, ampliando o efeito desejado de reflexão.
Em segundo lugar, a convergência de literatura com outras linguagens. O livro é um trabalho autoral com texto, ilustração, foto e diagramação, além do site. As fotografias foram tiradas especialmente para o livro, e cada página foi desenhada com cuidado.
Por fim, a criação de um site para o livro. Embora muitos livros tenham sites promocionais, o site de Vencer por linhas tortas é mais do que isso: é um site sobre o livro, uma sequência do livro, um espaço para o leitor aprofundar sua reflexão e sua experiência de leitura.
Claro que tais propostas são ainda muito incipientes, e espero intensificá-las nos meus próximos livros, nas minhas próximas histórias. Depois de tanto estudar, falar e me perguntar sobre o fim do livro, cada vez estou mais convencido de que o livro não irá terminar. Como não terminou o teatro quando surgiu o cinema, o cinema quando surgiu o videocassete e nem a pintura com o surgimento da fotografia. O livro impresso sofrerá, porém, uma profunda transformação, e nossa geração não consegue ver bem que transformação será essa.
O trabalho feito para este livro é apenas mais um passo nesse sentido. Algumas iniciativas podem não ser novidade, outras podem não fazer tanto sentido, mas entendam isso como uma ousadia autoral de alguém que ama palavras, ama literatura e acredita que ela existirá para sempre, seja no papel, na tela, na nuvem ou no suporte que vierem a inventar.
Olá, Marcelo.
Compartilho com teus sentimentos. Muitas das tua reflexões passaram por minha cabeça. E não somos os únicos, há muitos. Por esta capacidade inventiva, e esta coragem de ousar, te parabenizo. Estou louca para conhecer o "Vencer por linhas tortas"
Jacira Fagundes, Porto Alegre/RS 08/03/2015 - 16:20
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