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O pai e o filho
Oscar Bessi


Meu pai não gostava do Dia dos Pais. Eu gosto. “Data comercial”, resmungava. E eu aquiescia. Mas não praticava. No fundo, nem ele, mas isto jamais poderia ser dito ou insinuado. Pelo menos até minhas gargalhadas com a mãe, após ele sestear na poltrona ao som de Lombardi e Silvio Santos, quando a rígida censura patriarcal era violada. 
 
Como peguei estrada cedo e nossas relações viviam estremecidas, a cada agosto o recado vinha por ela, na semana anterior, quando eu ligava (a cobrar) de algum orelhão da capital a fim de sondar o ambiente: eu não precisava aparecer, não haveria nada de especial em casa. E, se aparecesse, nada dessa côsa de presente, nem receberia. Data comercial. E etc.
 
E lá desembarcava o filho na rodoviária, ítalo-caboclo e cabeçudo feito o pai, com um vinho ou livro embrulhado debaixo do braço. Aliás, sempre fui criativo em presentes. Era vinho ou livro e talvez não tenha dado nada diferente em décadas. Quase sempre comprado na véspera e, muitas vezes, não o desejado, mas o que o bolso permitia. E o pai se permitia um breve sorriso sob o bigode bem aparado, conferia sem jeito o presente, dizia que não precisava e agradecia numa faceirice monossilábica. 
 
Num ano de glória, dei-lhe um Saramago. No auge do Nobel e bem caro. Nunca contei que tinha comprado aquele livro pra mim, meses antes, mas sem um tostão no Dia dos Pais, não vi nada mais decente para que a data não passasse em branco. No primeiro ano em que não fui, por causa do trabalho, ele disse à mãe que sabia: no fundo, eu nem gostava dele.
 
Hoje, sou pai. De uma adulta, um adolescente e uma criança. Quero meus filhos perto de mim, domingo. Presente? Gosto daqueles cartões feitos a punho, tipo arte escolar. E nunca sei o que fazer no Dia dos Pais para agradá-los. Depois que o pai partiu, confesso, fiquei meio perdido. Amo ser pai, mas ser filho era mais fácil. Ainda que controverso. Eu acerto, hoje, com eles? Errei demais como filho. E esse trio que leva meu DNA, como me vê? Meu pai não demonstrava incertezas e eu, na dura rebeldia juvenil, considerava-o sempre errado. Hoje a maturidade e a saudade se unem para derreter convicções. E dizem que ele tinha razão, não em tudo, mas em muito do que tentou me dizer. 
 
Olho os livros que lhe dei. Todos em minha estante. O melhor destino não é algo que se saiba. A gente só desconfia, por acreditar. E tenta. E ama. No mais, tudo é incerto na vida. 
 
Exceto que precisaremos capturar pokémons neste domingo.  

 

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